terça-feira, 2 de outubro de 2007
Homo Faber-Castell
O homem velho caminha contra o paredão d’água marinha varrido pelo vento luminoso da manhã.
O homem velho avança, da esquerda para a direita, descortinando a paisagem. Seus pés deixam-se tocar pela água, as ondas varrem seus pés – areia e sal se misturam.
São passos lentos, decididos. São passos tangidos por uma vontade férrea, quase inconsciente. Quase senil. Senil.
Um dos braços, ou os dois, parece paralisado – há um quê de robô na caminhada, no corpo que avança.
É um corpo geométrico, cheio de ângulos, como se, por trás da carne pouca o esqueleto pretendesse representar as inúmeras possibilidades de articulação.
É um corpo velho, aceno matinal de como seremos amanhã, à tarde.
No crepúsculo.
Algumas léguas adiante do mezzo cammin di nostra vita.
É uma cena que dura pouco. O suficiente para o corpo velho descortinar a paisagem selvagem, de vento forte, ar marinho, luz do sol.
Uma paisagem ainda e muito mais antiga que a velhice que vem perseguindo aquele corpo, desde o dia de seu nascimento até hoje, pela manhã, quando desfila diante do meu olhar estúpido, buscando uma compreensão impossível porque inexistente.
Como se ela, a velhice, predador incansável, por fim alcançasse sua caça desiderata apenas para o puro deleite do meu safári particular.
Então, o velho apressa o passo, parece correr, com seu molejo de robô humano.
E corre.
Realmente corre.
Enquanto eu, no mezzo cammin di nostra vita, permaneço parado, lápis e papel na mão. Olhar abobado por trás dos graus dos óculos sujos.
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Um comentário:
Texto geometricamente perfeito!
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