sábado, 2 de fevereiro de 2008

cronaxia de carnaval : sábado

Eu acordo estendido na cama, em diagonal, a voz da minha filha me pergunta, que horas você vai se levantar, papai, eu me levanto não sei que horas, mas não durou muito tempo entre a sua pergunta e o xixi no vaso, e a água no rosto, e o capuccino e a TV ligada nos desenhos animados, e as conversas, e as discussões, e a minha partida, fuga do caos, carnevale, rota do sol, oitenta quilômetros por hora, em meia hora desemboco na Afonso Pena, viro à esquerda na Mipibu, o Oceano me espera, não o Atlântico, transbordando sobre o trapézio de Atlas, mas a academia de ginástica, de pesos, de máquinas de esculpir músculos sob a pele em tensão permanente, confesso agora que me rendi ao culto ao semideus Saúde, só me falta parar de fumar, não, meu deus, salvai-me desta blasfêmia, tenho ainda tantos camelos a tragar, por enquanto séries de doze a cumprir, doze levantamentos de halteres dos menores mais um de lambuja que o professor me envia a título de bolacha Maria, puta que pariu, a bolacha Maria é indigesta e eu tenho dificuldade de me concentrar nos números e na contagem dos números, mas sou aplicado, meus bíceps incham, meus tríceps se enrijecem, a batata da perna resta ainda chocha, no final foram algumas máquinas a me controlar corpo e mente, uma moça, gerente de um restaurante das vizinhanças me admoesta, cuidado, ele, o professor, vai fazer sua cabeça, você não vai conseguir se livrar desses exercícios, vai enlouquecer feito ele, enquanto isso eu suo, nem em bicas, nem em cântaros, nem porra nenhuma, é só um suor e não me paga ao menos o pão, brioche aziaga que masco como folha de coca a me livrar do mal da altura, faço um alongamento fast de olho no relógio, entro no banho, lavo a cabeça com shampoo chic, sabonete fake chic, algo como flor de maçã e erva cidreira, me enxugo, me penteio, meto uma camisa vermelha e vou ao hospital, assunto do qual me abstenho de falar aqui por demais íntimo, saio uns quarenta, quarenta e cinco, cinqüenta minutos depois, almoço com minha mãe, panquecas, banana, rocambole de sobremesa, estou meio puto e sem vontade de falar, fumo um, dois cigarros, leio um, dois jornais, não tem pó de café na casa da minha mãe, então, nada de café, só sofá, TV Globo, soneca, até as quatro, dezesseis horas sem a.m., p.m., de novo hospital, meio lerdo, meio tonto, outros quarenta, cinqüenta minutos, vou ao cinema, shopping, hospital dos solitários, admirar a manada, sorte, tem o gângster em meia hora, compro pipocas, uma coca cola pequena, me empoleiro entre os solitários e os casais solitários, sou um espectador privilegiado na New Jersey de fim dos anos sessenta, setenta, ufa, mergulho em águas profundas, saio do cinema doido pra matar alguém, encarar alguém, topar uma briga com alguém, em vez, saio ao estacionamento, pego o maço de camels no interior do carro, reentro até a livraria, flano entre as prateleiras, entre piza e castro opto pelas mil e uma noites na busca do original, nada de farsa, tragédia, ainda passo nas americanas, estranhamente quero um Diego Nogueira, um samba, será influência do carnaval.

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