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quarta-feira, 16 de setembro de 2009

funeral blues



Que parem os relógios, cale o telefone,
jogue-se ao cão um osso e que não ladre mais,
que emudeça o piano e que o tambor sancione
a vinda do caixão com seu cortejo atrás.

Que os aviões, gemendo acima em alvoroço,
escrevam contra o céu o anúncio: ele morreu.
Que as pombas guardem luto — um laço no pescoço —
e os guardas usem finas luvas cor-de-breu.

Era meu norte, sul, meu leste, oeste, enquanto
viveu, meus dias úteis, meu fim-de-semana,
meu meio-dia, meia-noite, fala e canto;
quem julgue o amor eterno, como eu fiz, se engana.

É hora de apagar estrelas — são molestas —
guardar a lua, desmontar o sol brilhante,
de despejar o mar, jogar fora as florestas,
pois nada mais há de dar certo doravante.

[W. H. Auden]


[ Man Ray, foto]

domingo, 13 de setembro de 2009

tous les matins du monde










(não sei dizer o que há em ti que fecha
e abre; só uma parte de mim compreende que a
voz dos teus olhos é mais profunda que todas as rosas)
ninguém, nem mesmo a chuva, tem mãos tão pequenas

[e. e. cummings traduzido por augusto de campos]




(i do not know what it is about you that closes
and opens; only something in me understands
the voice of your eyes is deeper than all roses)
nobody, not even the rain, has such small hands


my girl's tall with hard long eyes
as she stands, with her long hard hands keeping
silence on her dress, good for sleeping
is her long hard body filled with surprise
like a white shocking wire, when she smiles
a hard long smile it sometimes makes
gaily go clean through me tickling aches,
and the weak noise of her eyes easily files
my impatience to an edge--my girl's tall
and taut, with thin legs just like a vine
that's spent all of its life on a garden-wall,
and is going to die. When we grimly go to bed
with these legs she begins to heave and twine
about me, and to kiss my face and head.

[e. e. cummings]



quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Mostre-me quem devo desejar




2. Para te mostrar onde está teu desejo, basta te proibi-lo um pouco (se é verdade que não existe desejo sem proibição). X... quer que eu esteja lá, ao seu lado, contanto que eu o deixe um pouco livre: maleável, me ausentando às vezes, mas ficando não longe; de um lado é preciso que eu esteja presente como proibição (sem o que não haveria bom desejo), mas é também preciso que eu me afaste no momento em que corresse o risco de atrapalhar o desejo formado: é preciso que eu seja a Mãe suficientemente boa (protetora e liberal), em volta da qual a criança brinca, enquanto ela cose calmamente. Essa seria a estrutura do casal "bem-sucedido"; um pouco de proibição, muito jogo; designar o desejo, e depois deixá-lo, como esses nativos amáveis, que mostram bem o caminho a você, sem no entanto se oferecerem para acompanhá-lo.

[Roland Barthes in Fragmentos de um discurso amoroso, tradução de Hortênsia dos Santos, Rio de Janeiro: F. Alves, 1990]




[espere carregar o vídeo para assistir de uma vez.]

[Buffalo 66, de Vincent Gallo, 1998]





sábado, 1 de agosto de 2009

Ficha


“Foi só então que ocorreu a Robbie a possibilidade de que ela não estivesse fugindo, e sim atraindo-o para o canto mais escuro da biblioteca.”

[Ian McEwan in Reparação, tradução Paulo Henriques Britto, São Paulo: Companhia das Letras, 2002]


sexta-feira, 17 de julho de 2009

Todos los fuegos el fuego





Florentino Ariza escribía todas las noches sin piedad para consigo mismo, envenenándose letra por letra con el humo de las lámparas de aceite de corozo en la trastienda de la mercería, y sus cartas iban haciéndose más extensas y lunáticas cuanto más se esforzaba por imitar a sus poetas preferidos de la Biblioteca Popular, que ya para esa época estaba llegando a los ochenta volúmenes. Su madre, que con tanto ardor lo había incitado a solazarse en su tormento, empezó a alarmarse por su salud. Te vas a gastar el seso – le gritaba desde el dormitorio cuando oía cantar los primeros gallos –. No hay mujer que merezca tanto. Pues non recordaba haber conocido a nadie en semejante estado de perdición. Pero él no le hacia caso. A veces llegaba a la oficina sin dormir, con los cabellos alborotados de amor, después de haber dejado la carta en el escondite previsto para que Fermina Daza la encontrara de paso hacia el colegio. Ella, en cambio, sometida a la vigilancia del padre y a la acechanza viciosa de las monjas, apenas si lograba completar medio folio del cuaderno escolar encerrada en los baños o fingiendo tomar notas durante la clase. Pero no sólo por las prisas y sobresaltos, sino también por su carácter, las cartas de ella eludían cualquier escollo sentimental y se reducían a contar incidentes de su vida cotidiana con el estilo servicial de un diario de navegación. En realidad eran cartas de distracción, destinadas a mantener las brasas vivas pero sin poner la mano en el fuego, mientras que Florentino Ariza se incineraba en cada línea.


[Gabriel García Márquez, El amor en los tiempos del colera, Madrid: Mondadori, sexta edición, febrero 1988]






a tarde ardia com cem sóis

* * *

BRILHAR PRA SEMPRE

BRILHAR COMO UM FAROL

BRILHAR COM BRILHO ETERNO

GENTE é PRA BRILHAR

QUE TUDO O MAIS Vá PRO INFERNO

ESTE é o MEU SLOGAN

E O DO SOL


[Augusto de Campos \ Vladímir Maiakóvski in Maiakóvski – poemas, Boris Schnaiderman, Augusto e Haroldo de Campos, São Paulo: Perspectiva, 2003]






[Fotograma de Farenheit 451, de François Truffaut / Ray Bradbury]









domingo, 10 de maio de 2009

Versos de Nicolai


Dias se sucedem,
semanas se suc semanas se sucedem,
torvelinham,
num galop num galope célere;
como se cavalgássemos
sobre um tempo de so sobre um tempo de aço
voando
– olhos – olhos abertos –
pelo espaço pelo espaço pelo espaço.
Assim a vida,
ela nos atra ela nos atravessa –
o ouvido zoa,
o coração di o coração dispara,
como
se qu se quisesse
saltar para salta r saltar para
fora,
fora – é só o que lhe resta!
Se alguém
Se alguém tenta detê-lo,
Se alguém tenta detê-lo ele se altera:
toca a rebate,
toca a rebate dá por paus e pedras!
E quantas vezes
E quantas vezes o coração
E quantas vezes o coração explode
e não se ouve
e não se ouve a explosão
e não se ouve a explosão que o sacode.


[Nicolai Assiéiev, Coração batendo sem que se ouça, tradução de Haroldo de Campos, in Poesia russa moderna, São Paulo: Perspectiva, 2001]

sexta-feira, 8 de maio de 2009

Um soneto de William


Leva-me, amor, todos os meus amores:
Que tens agora a mais que não te déssemos?
Nenhum sincero amor, amor, que apores
Ao quanto era já teu sem tais acréscimos.
E se é por meu amor que o amor me raptas,
Não te posso culpar se dele abusas;
Todavia te culpo se te adaptas
Só por capricho ao que em geral recusas.
Gentil ladrão, eu te perdôo a ofensa,
Pois roubaste de ti minha penúria.
Que sempre soube o amor ser dor mais densa
Sofrer seus erros que do ódio a injúria.
llllLasciva graça, que faz bem do mal;
llllMorro do teu desdém, não teu rival.



[William Shakespeare, 40, in 42 sonetos, organização e tradução Ivo Barroso, Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2005]


quarta-feira, 6 de maio de 2009

Um poema de Ada



Como eu queria
passar um dia
dentro de ti

para saber
onde me guardas
se é que me tens...



[Ada Lima, in Menina gauche, Natal: Edições Flor do Sal, 2008]



sexta-feira, 17 de abril de 2009

2 elegias


VIAGEM INFINITA

para quem com seu incêndio te ilumina,
cósmico caracol de azul sonoro,
branco que vibra um címbalo de ouro,
último trecho da lâmina fina,

a mão que te busca na penumbra
se detém na tépida encruzilhada
onde musgo e coral guardam a entrada
e um rio de pirilampos te alumbra,

sim, portulano, da esmeralda o fulgor,
sirte e fanal numa mesma bandeja
quando a boca navegante beija
a poça mais profunda do teu dorso,

suave canibalismo que devora
sua presa que o dança no abismo ermo,
oh, labirinto exato de si mesmo
onde o pavor das delícias mora

água para a sede de quem te viaja
enquanto a luz que junto ao leito vela
desce às tuas coxas sua úmida gazela
e por fim a trêmula flor escacha


[Julio Cortázar, VIAGEM INFINITA in Último round, tomo I, tradução Paulina Wacht, Ari Roitman, Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008]


– Valérie, não me aporrinhe. As mulheres só chupam por amor ou por dinheiro. E você, comigo, nem uma coisa nem outra.
– Não lhe passou pela cabeça que eu possa gostar de você?
– Não diga bobagens, Valérie. Todos sabemos como são essas coisas.


[Martín Caparrós, Valfierno, tradução Josely Vianna Baptista, São Paulo: Companhia das Letras, 2008]


sábado, 20 de dezembro de 2008

VERSO


efêmero é o amor sem corpo.

Napoleão de Paiva Souza, amor veneris in Apenas chegaram, Alexandria: Barriguda, 1999











quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Níu-láife | 10 fins – segundo T. S. Eliot


I

Assim expira o mundo
Assim expira o mundo
Assim expira o mundo
Não com uma explosão, mas com um gemido

[Os homens ocos]

II

O que poderia ter sido é uma abstração
Que permanece, perpétua possibilidade,
Num mundo apenas de especulação.
O que poderia ter sido e o que foi
Convergem para um só fim, que é sempre presente.
[Burnt Norton]

III

As palavras se movem, a música se move
Apenas no tempo; mas só o que vive
Pode morrer. As palavras, após a fala, alcançam
O silêncio. Apenas pelo modelo, pela forma.
As palavras ou a música podem alcançar
O repouso, como um vaso chinês que ainda se move
Perpetuamente em seu repouso.
Não o repouso do violino, enquanto a nota perdura,
Não apenas isto, mas a coexistência,
Ou seja, que o fim precede o princípio,
E que o fim e o princípio sempre estiveram lá
Antes do princípio e depois do fim.
[Burnt Norton]

IV

Em meu princípio está meu fim.
[East Coker]

V

Não era (para recomeçar) o que antecipadamente se aguardava.
[East Coker]

VI

O conhecimento impõe um modelo, e falsifica,
Porque o modelo é vário para cada instante,
E cada instante uma nova e penosa
Avaliação de tudo quanto fomos. Apenas não nos decepcionaremos
Com tudo o que, decepcionando, já não causa mais dano.
[East Coker]

VII

Em meu fim está meu princípio.
[East Coker]

VIII

Onde o fim para isso tudo, para o surdo lamento,
Para a silente agonia das flores outonais
Que as pétalas gotejam e imóveis permanecem;
Onde fim que ponha termo ao torvelinho do naufrágio,
A súplica do osso nas areias, à insuplicável
Súplica para a calamitosa anunciação?
[The Dry Salvages]

XIX

Fim é o lugar de onde partimos.
[Little Gidding]

X

Não cessaremos nunca de explorar
E o fim de toda a nossa exploração
Será chegar ao ponto de partida
[Little Gidding]


Fragmentos de Os homens ocos e Quatro quartetos in T. S. Eliot; tradução, introdução notas de Ivan Junqueira – São Paulo: Arx, 2004

domingo, 23 de novembro de 2008

Ler / Escrever









[Vivian Wu em The pillow book de Peter Greenway, 1996]

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

anos a fio



[Gustave Doré, Inferno, 1857 circa]



O teu demônio me segue
anos a fio
ele tece flores para mim
divide meu corpo em partes
Ele me culpa
acena feliz por trás das labaredas
dança ao meu redor
cresce como uma planta
eu aparo suas bordas seu rabo seus chifres
O teu demônio me encanta
como um retrato antigo amarelado
uma xícara de louça no mercado
O teu demônio me espanta
canta para mim todas as noites
me arde me explora me atormenta
O hálito quente sobre a minha boca
a febre sempre
O teu demônio vai embora hoje
ou fujo dentro dele a galope
eu vivo dentro dele feito um passarinho
feito uma coisa miúda enorme pobre
dilatada como um crucifixo
dura como uma esmeralda
Me esmero e espero
um dia me chamo Laura
tu me abocanhas os peitos
eu te abocanho a alma


[Iracema Macedo, O TEU DEMÔNIO, in Lance de dardos. Rio de Janeiro: Edições Estúdio 53, 2000]

desde o início




[Ouka Lele, Autorretrato (herida como la niebla por el sol), 1987]



Eu só acreditava em Drummond:
O amor chega tarde
Não conhecia o amor que fulgura sem aviso
esse que se sabe proibido
o amor que já se sabe perdido desde o início
Eu não acreditava no impossível
vinha tão sóbria, tão cheia de medidas
não conhecia o esplendor da queda
nem a violência dos abismos


[Iracema Macedo, DANDARA, in Lance de dardos. Rio de Janeiro: Edições Estúdio 53, 2000]



thanx



AGRADECIMENTO A todas e todos que compareceram à Siciliano dia 19 passado, e, por que não, a quem também não compareceu e nem por isso se fez menos presente.

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Fragmento de um discurso amoroso




[Egon Schiele]




“Seu corpo estava dividido: de um lado, seu corpo propriamente – sua pele, seus olhos – doce, caloroso, e, de outro, sua voz, breve, contida, sujeita a acessos de afastamento, sua voz que não dava o que seu corpo dava. Ou ainda: de um lado, seu corpo molengo, morno, na maciez exata, fofinho, se fazendo de desajeitado, e, de outro, sua voz – a voz, sempre a voz –, sonora, bem formada, mundana, etc.”

Roland Barthes, Fragmentos de um discurso amoroso










terça-feira, 1 de julho de 2008

No cabaré: A puta e o anarquista


[De Blade Runner]

– O senhor é escritor?

– Eu? Não. Por que pergunta? A senhora gosta de escritores?

– Não, não gosto.

– Por quê? Não são más pessoas.

– São. São más pessoas.

[Roberto Arlt, Luba, in Ricardo Piglia, Nome falso, tradução de Heloisa Jahn, São Paulo: Iluminuras, 1988]

No cabaré: A puta e o anarquista – Momentos depois


[De Blade Runner]

– É melhor que não procuremos razões. O senhor parece, de fato, um escritor. Isso não é incômodo? Os escritores são como o senhor. Primeiro manifestam compaixão, depois se irritam quando a pessoa não se ajoelha diante deles como se fossem Deus. São exigentes.

– Mas como é possível que conheça os escritores? A senhora não lê nada.

– Tem um que costuma vir aqui.

[Roberto Arlt, Luba, in Ricardo Piglia, Nome falso, tradução de Heloisa Jahn, São Paulo: Iluminuras, 1988]

sábado, 21 de junho de 2008

Vladimir


[Napoleão]


Dândis
são
bacanas



[Volonté, Adriana Calcanhoto, proemas ou o caminho das últimas estrelas, Natal, 2004]


Estragon


[Volonté]



palavra
tronco
e membros.


[Napoleão de Paiva, corpo humano, Apenas chegaram, Alexandria: Barriguda, 1999]