A milhas e milhas de distância das escadarias do Memorial, teve um sonho.
O sonho, à beira-mar.
O mar, coalhado de ondas.
Silêncio.
O mar, aconchego pros corpos viandantes. Acalanto pros olhares marinhos, rascunho de catedrais e dragões.
Teve um sonho e no sonho despertou.
Como um peso leve, alguém subiu em seu leito e tocou-lhe as espáduas, como num toque de cura, examinou a pele do ombro, deslizou os dedos pela curva do colo até a nuca, afastou os cabelos puxando suas raízes e viu então a marca. E dela perguntou sem querer saber a resposta.
Tinha uma moça de coxas fortes e bronzeadas.
Tinha um cara mau, a cicatriz invisível no rosto mulato.
Tinha a criança calada e triste.
Tinha a cidade, quase dentro d’água, os prédios velhos e carcomidos.
A pergunta ficou sem resposta, como uma roupa na pedra do quarador.
A resposta se arrastou pelo soalho de tábuas e foi dar na poeira da estrada.
A turma toda lá. O Homem, a Mulher, a Criança, o Travestido, a Puta, a Louca.
E ela.
A que tocou as espáduas, a que despertou do sono.
E o olhar dela que não era pouco.
Infinito.
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