quarta-feira, 8 de agosto de 2007

the quietest moments


Como nunca mocinha fui, me foi negado o êxtase dizem inolvidável do primeiro soutien.

Meu valisère pessoal, minha madeleine inodora, foi uma bolacha preta. De vinyl.

Vinyl e soutien são dois estrangeirismos, sei. Têm equivalentes na língua portuguesa. Deveriam ser evitados. De bom tom.

Mas soutien não é o mesmo que sutiã, percebem?

Nem vinil algum chega aos pés do vinyl.

Já tem gente explicando pros mais novos, novíssimos, o que é um CD.

Pra começo de conversa CD é uma merda. E não é questão de abreviaturas – comparem: CD. LP. A pronúncia de um é seca, ríspida, fria. A do outro é malemolente, sensual, quente.

Imagina então se um disco de vinyl poderia aparecer assim, de supetão. Sente-se de longe o odor de mofo, bolor, naftalina. Surgem na cabeça imagens de pesados gramofones, discos de acetato, válvulas gigantescas e o cabelo de Olivia Newton-John.

À guisa de aula, lição de anatomia do elepê, este tem, basicamente, dois lados: o lado A e, naturalmente o B, às vezes chamados lado 1 e lado 2.

Os discos duplos, obviamente, seguem a mesma regra e lógica.

Plásticos transparentes envolvem a tal bolacha preta (antes, eram de papel). Uma capa de cartão quase quadrado envolve o plástico que envolve o vinyl – como a seda azul do papel envolve a maçã.

Nostálgicos melancólicos costumam descrever o ato de tirar um disco da capa, girá-lo entre os dedos tocando as bordas e apoiá-lo por fim no prato, da radiola, toca-discos ou simplesmente prato (para os, então, mais hi-tech), como o supra-sumo do prazer tátil, o equivalente da proustiana madeleine.

Ou dos dedos percorrendo a elasticidade do soutien alheio.

Levar o primeiro disco pra casa provoca a mesma emoção que tirar o primeiro soutien alheio. Com a vantagem que a aflição inexiste e a taquicardia acompanha o compasso do baixo, bateria, piano.

Meu primeiro valisère foi um disco do Supertramp, Even in the quietest moments... Assim mesmo, com as reticências.

Era “o disco do piano”, como o Atom Heart Mother era “o disco da vaca”, e por aí vai.

Na verdade foi meu primeiro elepê porque meu irmão já tinha o Breakfast in America em casa e o Crime of the Century podia ser pego emprestado na casa da esquina.

No derradeiro ano da década de setenta sair com um disco embaixo do braço exibindo para quem quisesse ver um piano de cauda coberto de neve era uma experiência e tanto.

Nem tentem repetir em casa.

Foi. Não é mais.

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