terça-feira, 28 de agosto de 2007

Contracorrente / uma tradução

recorte de jornal espanhol, década de 80

Em junho de 68, um mês apenas após o mítico maio francês (e no mundo todo), Pier Paolo Pasolini, escreveu uma poesia aos jovens romanos, depois de um violento confronto numa manifestação estudantil.

Expulso do Partido Comunista Italiano (PCI) alguns anos antes, enquanto homossexual, Pasolini foi, além de poeta, um dos mais importantes diretores do cinema italiano.

Na falta – ou desconhecimento meu – de uma tradução com certeza melhor, vai a minha, livre, como os versos de Pier Paolo:

O PCI para os jovens!

É triste. A polêmica contra
o PCI aconteceu na primeira metade
do decênio passado. Vocês estão atrasados, meninos
Agora, os jornalistas de todo o mundo (inclusive
aqueles das televisões)
puxam (como acredito que ainda se diz no ambiente
universitário) o saco de vocês. Eu, não, amigos.
Vocês têm a cara de filhinhos de papai.
A boa raça não mente.
Vocês têm o mesmo olhar malvado.
Vocês são amedrontados, inseguros, desesperados,
(certo) mas sabem também ser
prepotentes, chantagistas e seguros:
prerrogativas pequeno burguesas, amigos.
Quando ontem em Valle Giulia vocês brigaram
com os policiais, eu estava do lado dos policiais!
Porque os policiais são filhos de pobres.
Vêm da periferia, rural ou urbana que seja.
Quanto a mim, conheço muito bem
a maneira como foram meninos e rapazes,
o precioso um real, o pai ainda garotão também ele,
por conta da miséria, que não transmite autoridade.
A mãe, dura como um estivador, ou frágil,
porque doente, como um passarinho;
os tantos irmãos, a casinha
em meio à horta de erva-cidreira (em terrenos
alheios, loteados); os baixios
nas cloacas; ou os apartamentos nos grandes
conjuntos habitacionais, etc. etc.
E, depois, vejam como os vestem: como palhaços,
com aquele tecido áspero que cheira a quentinha,
repartição pública e povo. Pior de tudo, naturalmente,
é o estado psicológico ao qual são reduzidos,
(por mil reais ao mês):
sem sorrisos,
sem amizade com o mundo,
separados,
excluídos (numa exclusão sem igual);
humilhados pela perda da qualidade de homens
por aquela de soldados (ser odiados os fazem odiar).
Têm vinte anos, a idade de vocês, caros e caras.
Estamos de acordo, obviamente, contra a instituição da polícia.
Mas descarreguem sua ira contra a magistratura, e vocês vão ver!
Os jovens policiais
a quem vocês, por sacro vandalismo (de eletiva tradição
ressurgimental)
de filhinhos de papai, bateram,
pertencem a uma outra classe social.
Em Valle Giulia, ontem, aconteceu assim um fragmento
de luta de classe: e vocês, amigos (ainda que do lado
justo) eram os ricos,
enquanto os policiais (que estavam do lado
errado) eram os pobres. Bela vitória, então,
a de vocês! Nestes casos,
amigos, aos policiais se dão flores.
[...]


Traduzido por MIDC a partir de texto publicado em pagine corsare

Um comentário:

Moacy Cirne disse...

Pô, cara, ainda me lembro da polêmica, na época, provocada por esse poema. Criticamos Pasolini (eu e outros), então, mesmo reconhecendo que, sob certos aspectos, a razão estava com ele. Um abraço.