terça-feira, 14 de agosto de 2007

Um artigo inédito de Pe. Sabino Gentili



Mãe Luiza,


lindo pedaço de Natal, onde a beleza da geografia se encontra com a dureza da história.


Há muito Mãe Luiza vem sendo procurada: de um lado a luta dos sem-casa, dos sem-terra, dos migrantes do interior; do outro lado a ganância da especulação imobiliária, que a começar da Via Costeira vem avançando feito trator-demolidor sobre barracos, casas e casebres...


Até agora a defesa do bairro tem sido feita pelo próprio bairro – com seus problemas de água, de areia, de miséria e de “maconheiros / marginais”. Normalmente a “gente de bem” não sabe conviver com problemas sociais dessa natureza. Agora, depois de muita luta dos moradores de lá e do muito esforço de organização das entidades populares do bairro, a classe média pode ocupar a área – o terreno está limpo, o bairro virou nobre, pra turista ver e se deliciar com a linda vista sobre o mar...


Abre-se há alguns anos a Via Costeira, incentiva-se o turismo... A euforia é grande, até porque “turismo traz mais ocupação”, se diz...


Isso à primeira vista parece até ser verdadeiro. Turista precisa ser bem acolhido, é preciso mostrar a ele uma boa fachada...


E o povo do bairro? “Eles estão acostumados a viver precariamente. A gente pode até fazer uns embriões de casa. É um pouco longe, lá em Macaíba, lá nos Guarapes... mas eles estão acostumados.”


Assim a Mãe Luiza, terra dos “malandros”, de tantos que alimentaram a curiosidade doentia e o sadismo das páginas policiais dos nossos jornais, vai mudando de cara. Assim como vai mudando de cara e de história tudo que é olhado com cobiça e com critérios meramente lucrativos.


Mãe Luiza:


Não deixa a ganância imobiliária arrancar o verde dos coqueiros e da mata, nem sujar de asfalto tuas dunas arenosas.


Impede que tua orla marítima seja poluída pelos esgotos dos hotéis.


E briga para permanecer bairro popular, do jeito que os moradores desde o começo vêm tomando conta de ti, para que todos lembrem que na vida há outros valores diferentes da ganância e do lucro acima de tudo.


Sabino Gentili
[escrito em 1989]

Um comentário:

Moacy Cirne disse...

O seu blogue é uma boa surpresa, meu caro, a começar pela epígrafe de José Bezerra Gomes, um dos meus poetas preferidos. Dei uma geral, e gostei do que li sobre Antonioni. Sucesso no mundo virtual. Voltarei. Ah, sim, vi que o Balaio já está "lincado" (horrível, não?) aqui. Grato. E um abraço.